quinta-feira, 26 de abril de 2012

O homem que amava panturrilhas

Na mesa do restaurante, repleta de cafajestes, ele elevou a voz acima das frivolidades do momento e fez a revelação bombástica, apontando para a bela apresentadora do programa esportivo da TV:

- Ela é bonita, mas a panturrilha...

Aquela sentença, pronunciada com voz grave, quase lamentosa, teve o efeito de paralisar todas as outras atividades à mesa. Os entrecots, as picanhas na chapa, as batatinhas, as massas e demais iguarias ficaram livres momentaneamente do assédio voraz dos garfos e das facas. Um valor mais alto se alevantava.  Aquela frase, aquela entonação, aquele parceiro, que revelações ainda estavam por vir?! Todos os olhares se dirigiram para o autor da sentença, sentado à cabeceira da mesa, a mirar melancolicamente para a musa televisiva de panturrilhas imperfeitas.

- O que tem as panturrilhas dela?, perguntaram quase em coro os outros bandalhos, companheiros de confraria.

Ligeiramente constrangido, mas sem condições de rebobinar o tempo e deletar a revelação surpreendente, ele teve que admitir que seu fetiche em relação as mulheres eram as panturrilhas das moças.  Um súbito entusiasmo tomou conta do parceiro, que passou a discorrer com naturalidade e riqueza de detalhes sobre aquela parte da anatomia humana, a popular batata da perna, aqui considerado o naipe feminino. Amava panturrilhas bem torneadas, sem muita musculatura, mas firmes o suficiente para resistir aos afagos mais enérgicos e merecidos. Não sabia quando o fetiche havia começado, mas contou que passou alguns vexames diante de parceiras cujas panturrilhas não estavam de acordo com seu padrão estético.

“ Uma ou outra vez fiquei devendo”, informou à mesa atenta,  preferindo um eufemismo para a tradicional brochada. E nesse ponto esclareceu suas restrições à bela da telinha:

- Encontrei com ela no shopping e descobri que a panturrilha dela, da dobra do joelho até o tornozelo, é uma coisa só, massuda, sem curvas ou saliências, enfim, sem qualquer atrativo ou erotismo...

Cruelmente os confrades  se divertiam com o relato, mas eu que sou um poço de sensibilidade, observei que o parceiro agora  estava com os olhos marejados, como criança que descobre que o desejado brinquedo apresentava um defeito.  Ele recebeu bem o meu olhar de solidariedade e, mais animadinho, disparou outra frase bombástica:

- Agora só me resta a massagem tântrica...

Todos na mesa estacaram novamente. Aquele almoço prometia novas e trepidantes surpresas.






sexta-feira, 20 de abril de 2012

O sequestro do bonde Petrópolis

*Publicado originalmente em 16/10/2009

                O bonde Petrópolis, em foto de 1957, anos antes do sequestro.

A mesma turma do bairro Petrópolis que trocava por palavrões os letreiros do cinema Ritz ( O Circo de Petrópolis: Sessão da tarde no Ritz, publicado em 15/10/09) decidiu, numa noite de tédio, buscar novas emoções. Na prática, planejaram seqüestrar o bonde Petrópolis, cujo fim da linha ficava na esquina da Protásio Alves com a Carazinho.

A linha do bonde Petrópolis era dupla até a João Abott e ali derivava para uma única linha até o destino final, em frente ao Bar Forianópolis, a meia quadra do cinema Ritz e da igreja de São Sebastião. No fim da viagem, antes de tomar um ou um cafezinho, o motorneiro e o cobrador providenciavam a inversão da haste que ligava o veículo à rede elétrica para permitir o retorno ao centro da cidade. Os zelosos funcionários tratavam de levar junto a alavanca que funcionava para arrancar e dar velocidade aquele monstro. A tal alavanca, embutida num equipamento da cabine, era um misto de chave de ignição, guidão, acelerador e freio.

Conhecendo bem esses procedimentos, a turma de Petrópolis ficou noites e noites na campana, esperando um vacilo dos condutores do bonde. Foi então que num sábado, tarde da noite, o motorneiro esqueceu a alavanca, já engatada no dispositivo da cabine, quando foi bater ponto no Florianópolis. De imediato, três rapazes assumiram o controle do elétrico, acionaram a alavanca e saíram em disparada rumo ao centro.

Os relatos dão conta de que cinco passageiros já estavam embarcados. Cinco apavorados passageiros a mercê daqueles tresloucados e sem poder desembarcar. Mas o seqüestrador que fazia às vezes de cobrador tratou de acalmá-los, anunciando: “Hoje é de graça, minha gente”. Sem saber, estava inventando o passe livre.

Pelo menos duas paradas separavam o fim da linha do entroncamento da João Abott, mas o bonde passou por elas em alta velocidade. As raras pessoas que aguardavam o transporte se surpreenderam com a passagem daquele bonde conduzido por homens sem o uniforme caqui da Carris. E ainda por cima passavam abanando e as gargalhadas. Quando se deram conta do rapto, o motorneiro e o cobrador saíram correndo atrás, acenando freneticamente e gritando para que parassem e devolvessem o veículo. Uma cena de filme! Mas o bonde já tinha ganhado uma boa dianteira e ali pela esquina da rua Ijuí - a uma quadra das longas desde o fim da linha -  a dupla cansou e ,cada vez mais aflita, decidiu seguir a passo para tentar resgatar o carro perdido.

Enquanto isso, na altura da bifurcação da João Abott, os seqüestradores não souberam realizar a manobra que desviava o bonde para a segunda linha, pararam o veículo e sumiram na escuridão, cada um para um lado. Os passageiros que estavam embarcados, ainda em pânico, aproveitaram para também debandar. Duas ou três pessoas que aguardavam o transporte na parada da João Abott ficaram sem saber se subiam naquele bonde-fantasma, estacionado fora de lugar, com as luzes acesas mas sem motorneiro nem cobrador. A dupla chegou em seguida, já sem fôlego e, após verificar se havia estragos, tratou de rumar para o centro, vexada com o ocorrido.

Claro que no dia seguinte o seqüestro do bonde Petrópolis foi o assunto em todas as rodas. A história era contada e recontada e, com o passar dos anos, ganhou a condição de lenda urbana. Há versões, evidentemente equivocadas, de que o Tadeu e eu, só porque éramos conhecidos como Irmãos Diabo, teríamos liderado a gang que realizou o seqüestro. Repito, não é verdade. Nego, peremptoriamente. Nós sabemos quem foi e o que fizeram naquele verão do passado.

sábado, 14 de abril de 2012

Cláudio Cabral, grande figura


Cláudio Cabral não era o principal comentarista da praça.  Na real, tinha tudo para não vingar na função:  era monotemático nas suas análises, porque defendia sempre os mesmos pontos de vista;  a voz anasalada e sem a imposição dos concorrentes clássicos era outro atrapalho na sua carreira; e, pecado capital no grenalizado e esquizofrênico futebol gaúcho:  não escondia sua preferência clubística e nem poderia, eis que participou de uma corrente que fez história no Internacional, conhecida como Os Mandarins – a  vinculação histórica,aliás, nunca impediu que fosse um algoz do seu clube de coração, quando apontava os erros das direções ou os equívocos dos técnicos.  
Mesmo assim, Cabral é saudado como “O Mestre”, tanto pelos mais antigos como pelas novas gerações e  os aspirantes da chamada crônica esportiva.  É que essa figuraça conhecia futebol como poucos, o que lhe garantia respeitabilidade e seguidores fiéis, além de esbanjar carisma, o que o tornava singular entre os que tinham o privilégio de privar com ele.

Monarquista convicto – “mas da monarquia parlamentarista”, fazia questão de esclarecer -, viciado em palavras cruzadas, santamente devasso, exibia gostos sofisticados que os modestos salários nem sempre sustentavam e, acima de tudo, era um parceirão no trabalho e fora dele.  
Cabral não talvez não tenha avaliado, mas bebi na sua sabedoria muitas vezes, embora também tenha  sido vitima constante de suas frases cruéis, definitivas, mas sempre verdadeiras: “Flávio Dutra, tu és um vidrinho de vaselina, sem o vidrinho...”. Eu magoava, mas era obrigado a reconhecer que ele tinha razão.  Podia ser pior, porque para determinada gestão colorada, reservou uma variação menos nobre sobre  o recipiente e seu conteúdo: “Essa direção é um balde de bosta...sem o balde”.

O frasista talentoso é provavelmente o traço mais marcante do nosso Cabral para aqueles que conviveram diretamente com ele no dia-a-dia.  Seus companheiros na Band e de outras parcerias lembram algumas das suas sentenças mordazes. O perna de pau era seu alvo preferido: “Jogador ruim não pode ficar nem no banco porque senão acaba jogando”; “Jogador ruim nunca se machuca”; “Se a bola tivesse vontade própria ia a delegacia e denunciava o Edinho por maus tratos”;  “Olha aqui, pega uma múmia, tira as faixas e ela vai jogar mais que o Celso”; “O Rooney é o Badico que fala inglês. Desculpa, Badico pela comparação”; “Gabiru foi a maior ironia do destino”; “Não leva nota, não entrou em campo”.
Não poupava os treinadores: “Treinador bem pago é treinador ruim, que recebe de dois ou três times ao mesmo tempo”;  “O Parreira é um camarada que daqui a pouco fez um cursinho de inglês e virou referência de treinador”;  “Fulano é Vigário José Inácio”, associando a rua central da cidade com a vigarice, que devia ser entendida como enganação.  Mas tinha outra forma de discordar das opiniões ou informações alheias e, neste caso, as maiores vítimas eram os repórteres: “Baldasso, tu não vais me passar esse cachorro”.

Era  exigente, irreverente, radical, exagerado:  “Sou do tempo em que o Inter ganhava de 3 x 0 no Beira-Rio e era vaiado”. “Sem a bola eu e o Pelé somos a mesma coisa”; ” Pior que vencer o Gauchão é perdê-lo”; “Fulano consome a energia de uma usina para acender uma lâmpada”. Falava e assinava embaixo.
Por tudo isso, acho que a grande perda de Cláudio Cabral, que nos deixou neste sábado chuvoso, não foi para o futebol ou para a radiofonia, mas para a convivência humana. Pena que eu tenha convivido tão pouco com ele.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

A pauta da sexta-feira Santa.

                                         Oliboni, Cristo por um dia

Repórter de plantão na sexta-feira Santa enfrenta uma pauta obrigatória: a cobertura da encenação da Paixão de Cristo no Morro da Cruz, no Partenon, também conhecida como subida ou procissão do Morro da Cruz. O evento ocorre desde 1960, criado pelo padre Angelo Costa, já falecido, e cresce a cada ano, reunindo preferencialmente atores da comunidade. Lá no final da década de 80 do século passado este que vos fala era repórter de geral da Zero Hora, estava de plantão da sexta-feira Santa e, claro, foi escalado para acompanhar a encenação.
Lembro bem que era um dia quente no final de março e para escapar das obviedades das coberturas tradicionais, decidi escolher dois ou três personagens interpretados por atores locais para, através deles, montar a minha matéria.  Um dos personagens era balconista de uma ferragem e intérprete do soldado romano que passava toda a encenação surrando, com uma espécie de relho, um dos ladrões, que na vida real era motorista de táxi.  É importante esclarecer que a encenação reproduz a Via Sacra  e suas 14 estações ou etapas do suplício de Cristo naquela sexta-feira, há mais de dois  mil anos. Só que alguns atores imprimem demasiado realismo a suas interpretações e era  caso do soldado romano que, volta e meia, pesava a mão contra o pobre e talvez bom ladrão. O infeliz olhava enfurecido para seu algoz, mas nada podia fazer durante a celebração religiosa, mesmo que o sacana legionário revelasse perversa satisfação em maltratar o companheiro de elenco.  Sei lá se não deu o troco após o evento. O soldadinho, um sujeito atarracado e malvado, bem que merecia.

O mais inusitado ainda estava para acontecer naquela encenação do século passado.  O gran finale seria a ascensão de Cristo, a partir da capelinha existente no platô do Morro da Cruz e onde ocorria o final da procissão.  O espetáculo no fim da tarde previa jogo de luzes, uma trilha épica e aqueles fumacinhas de shows,  que acompanhariam a subida do Filho de Deus feito Homem aos céus. Um engenhoso sistema mecânico elevava o ator, com suas vestes brancas, enquanto ele recitava lições de religiosidade. O ator já era o ex-vereador Aldacir Oliboni, considerado a réplica moderna do Cristo, de acordo como mostram as ilustrações que conhecemos.
Pois bem, lá estava o Cristo- Oliboni exortando os fiéis quando, à esquerda do platô, começou uma movimentação frenética. “É ele, é ele, sim!”, repercutia a massa.  Voces estão autorizados a pensar que era o próprio Cristo redivivo comparecendo ao seu velório, mas na verdade era quase isso, guardadas as proporções e o período histórico.  Quem surgia triunfalmente era Sérgio Zambiasi no auge da sua popularidade. O Zamba foi cercado e festejado pela multidão, enquanto Cristo subia ao encontro do Pai,  lentamente e quase de forma incógnita.

Oliboni ainda tentou atrair a atenção dos infiéis, gritando palavras de ordem pelo sistema de som:  “Cristo está aqui!  Cristo está aqui! Agora é o momento  glorioso da subida aos céus. Venham, venham, é aqui que está o Filho do Senhor! Demos glórias ao Senhor!”, apelava o bom Oliboni. Inúteis apelos.  A massa queria mesmo era confraternizar – e fazer pedidos – a quem mais tinha a oferecer naquele momento.  Entre os consolos espirituais que Oliboni inspirava e os materiais que Zambiasi poderia proporcionar  a escolha do povo pecou pelo pragmatismo, mesmo na Semana Santa.
Confesso que fiquei penalizado com a situação do Oliboni, supliciado durante toda a subida do morro e justo no momento da sua consagração como Cristo e ator o público o abandonava daquela forma, trocando-o por uma situação tão mundana.  De novo, mais de dois mil anos depois, a história se repetia e  o povo renegava Jesus Cristo.

Insensível público, mas depois fiquei pensando que fatos como o que presenciei talvez expliquem porque Sérgio Zambiasi chegou a senador e Oliboni, mesmo sendo Cristo por um dia, só agora conseguiu assumir como deputado estadual, ainda assim vindo da suplência. Mas aí já é outra história, nada a ver com a Semana Santa.
Boa Páscoa a todos. Que o coelhinho seja mais generoso que a massa que renegou Cristo-Oliboni.

sábado, 31 de março de 2012

Deixar de fumar

Vou completar cinco meses sem fumar. É a quinta ou sexta vez que me submeto ao suplício de me apartar do cigarro e sempre digo que “agora é pra valer”.  Até então,  o “prá valer” valia até o primeiro churrasco ou o happy hour regado a muita bebida, a tragada inconseqüente e em seguida a dependência voltava mais forte, como a compensar o período de afastamento.

Devo confessar que já havia tentado de tudo para superar o cigarro: adesivo, sementinha na orelha, chiclete de nicotina, remédios milagrosos, mas o tabagismo vencia sempre. Em uma das recaídas cheguei a usar tudo ao mesmo tempo, enquanto continuava a fumar. Antes que eu me transformasse num homem-bomba o médico que me prescrevia os tratamentos achou mais saudável que eu ficasse apenas com o cigarro.  A experiência me leva ao convencimento  de que nada supera a força de vontade e a persistência, processos que adotei atualmente.
É dura a vida do quase ex-fumante. Escrevo 'quase' porque, segundo alguns especialistas, não haveria ex-fumante ou ex-alcoolista.  A gente ficaria dependente toda a vida, com o vicio à espreita, só esperando a vacilada para voltar com tudo e mais um pouco. Uma coisa é certa: não vou me transformar num quase ex-fumante chato, como alguns que conheço e que passam a patrulhar os que resistem heróicamente, os quais invejo no momento – os que resistem e não o chatos.

Mas, repito,é dura a vida do quase ex-fumante.  Além da barriga crescente, ainda mantenho alguns dos hábitos dos tempos tabagista, como deixar a mesa de refeições rapidamente para fumar aquele prazeroso cigarrinho. E todos sonhamos  com cigarro; sonhamos que voltamos a fumar e acordamos cheios de culpa pela recaída, o que mostra a intensidade do registro do vicio-prazer em nosso organismo e em nossa mente. O pior é que deixamos de ter sonhos eróticos para sonhar com cigarro.  A propósito, noite dessas resisti bravamente em sonho à oferta para dar umas tragadas.  Será  que estou curado, que voltarei a sonhar com lindas mulheres e não com cigarros? Aguardemos os próximos capítulos.


domingo, 25 de março de 2012

Caranguejópolis

Coisas estranhas estão acontecendo em Pequenópolis, capital de Rio Apequenado do Sul. Os professores são contra aumento de salário, ciclistas criticam a construção de ciclovia, urbanistas lideram a oposição ao projeto de recuperação da orla e por aí vai. São os “caranguejos do não”, uma minoria barulhenta e retrógada, em plena ação contra o que possa representar melhorias para todos. Os “caranguejos do não” detestam tudo o que pode dar certo.

 A eles veio juntar-se uma carangueja charmosa e tida como bem articulada que, a pretexto de saudar o aniversário de Pequenópolis, partiu para a desqualificação de tudo do espaço a ser homenageado, como se vivesse no pior dos mundos e tivesse soluções mágicas para todas as mazelas.  
Os argumentos de uns e outra são falaciosos, oportunistas, corporativistas, politiqueiros e, a rigor, não deveriam surpreender. Em Pequenópolis, como num cesto de caranguejos interesseiros, é assim que funciona: qualquer tentativa mais ousada de se sobressair é obstaculizada pelos crustáceos que puxam para baixo.  Desse jeito, Pequenópolis vai trocar de nome. Sugiro Caranguejópolis.

quinta-feira, 15 de março de 2012

O blogueiro que sabia demais

Começo a temer pela minha integridade física. É que por circunstâncias diversas e encontros variados passei a ser detentor de segredos que me tornam um sujeito muito perigoso, capaz de balançar o establishment e derrubar reputações tidas como ilibadas. Antes que os apressadinhos tirem conclusões equivocadas informo que nada tem a ver com o mundo da política ou mesmo com atividades profissionais.


Na verdade, tenho sido depositário de cabeludos segredos de alcova, inconfessáveis infidelidades matrimoniais, ardilosas maquinações em busca dos melhores prazeres dessa vida. Carreguei nos adjetivos porque as situações merecem. Não há o que não haja nesses tempos de relacionamentos fugazes.

O mais dramático é que me escolhem - homens e mulheres, sem distinções, nem preconceitos - para relatar as bandalheiras que cometem, logo eu que sou ex-atleta à beira de uma profunda depressão pela lembrança dos tempos do “era bom!”. Desse jeito, logo passarei a ser conhecido como “O blogueiro que sabia demais”, quem sabe tema para um best seller e mote para um oscarizável roteiro cinematográfico, o que só vai aumentar o perigo que me cerca.

Entre os casos, talvez possa relatar o sucedido com uma querida amiga. Foi assim: em uma festa num clube náutico deparou com um dos nossos poucos atores globais. A moça era bem ajeitadinha e recém havia sido brindada com uma foto num jornal local como “A bela da praia – Imcosul”. O patrocínio da promoção indica que o fato deu-se há muito tempo. A verdade é que a jovem, cheia de moral e munida de um pratinho de salgadinhos e das piores intenções, aproximou-se do galã, oferecendo os quitutes e algo mais, se a primeira oferta fosse aceita. O global polidamente recusou os acepipes, mas sua acompanhante (sim, ele estava acompanhado, mas mesmo assim foi assediado pela nossa amiga), fez menção de se apossar da bandeja.

- Ah, eu quero, falou dengosa a acompanhante.

- Sai pra lá, chinelona. Tu achas que eu ia trazer salgadinhos para ti, repeliu, com veemência, a assediadora.

Sem exageros, foi assim que aconteceu e hoje, passado alguns anos do episódio, a agora Senhora da Praia, filosofa.

- A rejeição é sempre ruim, só que eu fui rejeitada por um ator global, mas dei o troco naquela sirigaita.

Teria outras histórias bem mais escabrosas para contar da mesma pessoa e de outras que me cercam, mas por segurança me impus um silêncio obsequioso.

Porém, nem tudo está perdido, caríssimos. Também me relaciono com gente do bem, como um caro amigo, rapaz bem situado na vida que tem sido assediado ostensivamente por quatro ou cinco raparigas, uma mais linda que a outra. Mas ele resiste e sua arma de defesa contra as pretendentes é a reluzente aliança de noivado, que exibe tão ostensivamente como o assédio que sofre. A porção maldosa dos meus parceiros já faz apostas em relação ao tempo em que o jovem resistirá. Eu, como ainda acredito na humanidade e que o bem sempre vence, estou apostando todas as minhas fichas como ele não cederá às tentações. Inclusive, estou disposto a auxiliá-lo nesse enfrentamento...É só me convocar.

E assim, de história em história, vou acumulando informações e me tornando um perigo para os que me cercam e para mim mesmo. Prestem atenção: se algo me acontecer, procurem saber com quem almocei nos últimos dias. O suspeito (a) ou suspeitos (as)  certamente estarão entre os comensais...

quinta-feira, 1 de março de 2012

O presente

A historia é verdadeira, tem testemunha confiável, mas os nomes são omitidos por razões que vocês logo vão entender. Tudo começou quando o nosso bom parceiro X recebeu um inesperado telefonema no meio da tarde.

- X,  larga tudo e vem rápido aqui no meu escritório.
Quem fazia o apelo era Y, um amigo de fé, empresário bem sucedido e parceiro de  X em outras empreitadas.-

-  O que aconteceu, alguma coisa grave? preocupou-se X.
- Não, mas larga tudo e te manda pra cá, ordenou Y.

Agora mais curioso do que preocupado, X dirigiu-se ao escritório do amigo, na região central de Porto Alegre. Lá chegando foi apresentado uma moça, compenetradamente sentada no sofá do escritório.
- Querida, abre os botões do vestido, pediu Y, com um toque de delicadeza.

X ficou assombrado com o que viu. O vestido funcionava como uma capa: a moça não vestia nada por baixo. Loira natural, depilada, era do tipo mignon, mas naquelas circunstâncias apresentava-se como um monumento de mulher. E, para provocar ainda mais, fazia o gênero doce e meiga.  X quase teve uma ereção.
 Antes que o embasbacado X perguntasse, Y explicou o que significava tudo aquilo.

- O Z,  um  cliente meu, ligou hoje cedo dizendo que estava mandando um vinho de presente pelo meu aniversário.  Aí apareceu essa belezinha ai com o tal presente, mas pediu que eu fechasse a porta do escritório e abriu o jogo, faceira e maliciosa: “Doutor, o presente sou eu!”.
Dito isso, colocou-se à inteira disposição de Y, fornecendo inclusive a camisinha para a segunda parte da sessão.

- Humm, foi bom!, suspirou Y, acrescentando:
- Achei essa coisa tão extraordinária que precisava que alguém viesse aqui testemunhar. Obrigado,amigo pela solidariedade.

Solidariedade até por aí.  X confessa que morreu de inveja do parceiro, mas saiu de fininho deixando o casal à vontade, quem sabe para uma nova rodada.
Ao ouvir o relato dessa história me dei conta de como os meus amigos são sem imaginação. Eles só me enviam vinhos – mesmo -  de presente.

domingo, 26 de fevereiro de 2012

Nicolelis, encantador e perturbador

* Publicado originalmente em maio/2010, mas o tema está atualíssimo.

Foi perturbadora, para dizer o mínimo, a conferência do médico e cientista Miguel Nicolelis na abertura da edição 2010 do Fronteiras do Pensamento. Perturbadora porque não tinha idéia do alcance do trabalho desenvolvido à frente do Instituto Internacional de Neurociência de Natal-RN, nem maginava o avanço das pesquisas realizadas na Universidade de Duke-EUA e seu potencial de melhorias para a raça humana. A grande mídia parece não se interessar sobre os experimentos e os projetos do dr. Nicolelis.

As experiências com macacos - aos quais Nicolelis se refere amorosamente e não como simples cobaias -, trazem esperança de devolver a mobilidade a portadores de necessidades especiais, por meio das chamadas próteses neurais – equipamentos eletrônicos que podem ser acionados por sinais cerebrais. Igualmente, as pesquisas buscam apontar caminhos para os portadores de doenças degenerativas, como o Mal de Parkinsom - no caso as experiências são com camundongos.

Nicolelis, 49 anos, palmeirense fanático, não se limitou ao relato de cases, mas mostrou macacos e camundongos em ação, durante as experiências, com resultados visíveis. É impressionante o vídeo em que uma de suas macacas preferidas (seria a Aurora?) joga videogame, comandando por estímulos cerebrais um braço mecânico localizado em outra sala. Detalhe importante: a macaca várias vezes tenta trapacear no jogo, como se fosse um humano qualquer. É isso que também me leva a considerar perturbadora a exposição de Nicolelis. Ao assistir aos vídeos a relação obrigatória foi com a obra O Planeta dos Macacos, na qual os símios, de evolução em evolução, acabam dominando a Terra, transformando em escravos os decadentes humanos. Prefiro pensar que as experiências dos neurocientistas vão trazer novas e boas perspectivas para futuro da humanidade. Certamente é isso que move o dr. Nicolelis e suas equipes, nos EUA e aqui.

A conferencia foi também encantadora quando Nicolelis revelou a grande dimensão social do trabalho realizado em Natal, não apenas nos bem aparelhados laboratórios, mas envolvendo crianças e jovens da periferia em uma das áreas mais carentes do país. Um trabalho de iniciação científica e inclusão social de valor incalculável, por meio da Fundação Alberto Santos Dumont que empresta seu apoio a todo o projeto.

A escolha de Santos Dumont para batizar a Fundação não é aleatória. O “Pai da Aviação” é inspiração para Nicolelis. O cientista se emociona quando vincula a obra do brasileiro que tornou realidade o sonho de Ícaro com o trabalho desenvolvido em Natal. Santos Dumont sonhou e foi atrás da realização de seu sonho. E é disso que Nicolelis fala e destaca: de gente que sonha e realiza, que promete e entrega, que projeta e faz acontecer; na crença na energia humana a serviço do bem-comum.

Trata-se de um Paulo Coelho da Ciência, questiona alguém? Devagar com o andor, porque o misticismo passa ao largo das argumentações do pesquisador, seus conteúdos têm sólida base científica e resultados demonstráveis para reforçá-los.

Nicolelis foi aplaudido de pé pelo público que lotou o Salão de Atos da Ufrgs, segunda-feira à noite. Acredito que seja a primeira vez que isso acontece no Fronteiras. O nosso Santos Dumont da neurociência já merece o Prêmio Nobel de Medicina para o qual está sendo cogitado

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Quase um ermitão

Do jeito que 2012 está se comportando vou acabar fugindo para as montanhas e virar ermitão. Só assim  para conviver com uma realidade que dá de goleada na ficção nesse início de ano.  Já nem falo da rotina dos edifícios desabando, da crueldade de bebês abandonados e dos assaltos cinematográficos à bancos. O que está pautando agora esse arrancada de um ano,  já prenhe de acidentes, incidentes e incidências incomuns,  são alguns estudos e pesquisas surpreendentes, tão surpreendentes como o fato de Wando deixar de ser brega e virar chic e cult, ao partir desta para melhor.

Até mesmo o sisudo judiciário está contribuindo para a perplexidade geral nesses tempos confusos, tanto assim que o Tribunal de Justiça de São Paulo determinou a prisão domiciliar de um morador de rua preso em flagrante sob acusação de furto.  Detalhe é que o cidadão pode ser preso a qualquer momento por não cumprir a decisão judicial de ficar em casa...

Agora se vocês estão pensando que decisões judiciais absurdas são privilégio do Brasil, olha só o que aconteceu na Flórida (EUA): um juiz resolveu meter a colher em briga de marido e mulher e obrigou o sujeito a levar a madame para jantar no local escolhido por ela. E mais: deveria presenteá-la com flores, acompanhadas de cartão romântico e, suprema decisão, levá-la a um boliche.  Tudo porque o réu havia agredido a esposa depois que ela exigira sair para comemorar o aniversário. Não há o que não haja. Ou como diria um operador do direito, das nossas relações: “Me tira o tubo”.
E como encarar as tais pesquisas de resultados surpreendentes? Os estudos envolvendo a cerveja são típicos.  Instituições insuspeitas já haviam divulgado pesquisas dando conta de que a loura gelada fortalecia os ossos, combatia o diabetes e contribuía para evitar ataques cardíacos.  Agora, contrariando todas as evidências, uma pesquisa da Universidade de Barcelona com 1.249 homens e mulheres , após investigar se a cerveja é a principal responsável pela “barriguinha saliente” em consumidores da bebida, chegou a conclusão que, em vez de fazer engordar, a cerveja, na verdade, evita o ganho de peso.  

Falta dizer que a “barriguinha” ganhou uma adesão de peso, sem trocadilho. Trata-se da psicóloga e especialista em sexologia, Carla Moura, que publicou artigo aconselhando as mulheres a darem preferência aos barrigudinhos nas suas relações. Segundo a doutora, minha nova ídala, "homens com barriga não são metidos, nem prepotentes, nem donos do mundo; eles sabem conquistar as mulheres por maneiras que excedem a barreira do físico. E eles aprenderam a conversar,a ser bem humorados, a usar o olhar e o sorriso pra conquistar. É por isso que eu digo que homens com barriguinha sabem fazer uma mulher feliz".  Depois dessa, suspendi de vez as sessões da academia e as caminhadas matinais.

A verdade é que, mesmo que sejam favoráveis, tais pesquisas desafiam o senso comum e deitam por terra as mais arraigadas convicções. Mas nada, nada mesmo, me deixou mais tonteado nesse inicio de ano que ver uma foto do Zeca Pagodinha bebendo...água! Ai já é demais. Fui pras montanhas esperar o  fim dos tempos.